Estátua da mãe de Jesus apareceu na rede de três pescadores em outubro de 1717
Oswaldo Corneti/Fotos Públicas
Imagem de Nossa Senhora Aparecida é o mais forte símbolo religioso nacional
Aparecida do Norte
- Em 300 anos, Nossa Senhora Aparecida já foi roubada, espatifada,
chutada e usada a bel-prazer de governantes dispostos a tirar uma
casquinha do mais forte símbolo religioso nacional, da princesa Isabel
aos generais da ditadura.
Chega numa redoma à prova de balas para seu jubileu de três séculos, a ser celebrado nesta quinta-feira (12), no santuário e na cidade paulista que levam o seu nome. "Só duas pessoas têm acesso [ao caixote de vidro]", conta o padre João Batista de Almeida, reitor do Santuário Nacional de Aparecida e uma das pessoas com a chave no bolso (a outra é o arcebispo local).
Todo cuidado é pouco ao se tratar da Aparecida que por pouco não desapareceu, quatro décadas atrás. No dia 16 de maio de 1978, Rogério Marcos, um jovem de 19 anos com distúrbio mental, invadiu a basílica e roubou a estátua da mãe de Jesus "aparecida" (daí o nome) na rede de três pescadores em outubro de 1717 - estava havia sabe-se lá quantos anos submersa no rio Paraíba do Sul, rachada em dois pedaços (cabeça e corpo).
Na fuga, o larápio deixou a imagem cair no chão. A santa despedaçada, com partes reduzidas a lascas e farelos, foi reconstruída a duras penas, com cola argentina. Um detalhe biográfico curioso da representação de Maria promovida a padroeira do Brasil em 1931, no governo do bem pouco religioso Getúlio Vargas.
O gaúcho podia até achar que "a moral cristã é contrária à natureza humana", como disse no Natal de 1907, quando foi orador de sua turma na formatura na Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. A exaltação da Virgem Maria verde-amarela, contudo, veio a calhar para ele, que viu na Igreja Católica uma aliada após a revolução de 1930.
As representações da mãe de Jesus ganham tempero local. No Brasil é a negra Aparecida. A de Copacabana, guardiã da Bolívia, tem traços indígenas. México cultua a latina Nossa Senhora de Guadalupe.
Para evangélicos, Maria existiu, mas não é santa coisa nenhuma. Esse segmento religioso, que foi de 1% da população brasileira em 1890 para os atuais 30%, evoca um dos dez mandamentos ("não farás para ti ídolo de escultura") para explicar por que rejeitam a adoração católica a santos e suas imagens. A aversão rendeu um dos episódios mais polêmicos envolvendo Nossa Senhora Aparecida (uma réplica, no caso).
Cid Moreira, então âncora do "Jornal Nacional", falava num tom mais grave do que seu habitual sobre o episódio que causou "indignação em todo o País", justo no "dia da padroeira do Brasil".
Um dia antes, 12 de outubro de 1995, um pastor da Igreja Universal do Reino de Deus, em programa da emissora do bispo Edir Macedo, deu sopapos e pontapés na imagem. O bispo Sérgio Von Helder apresentava seu "Despertar da Fé", na Record, quando golpeou um ícone da santa.
"Estamos mostrando às pessoas que isso aqui, ó, isso aqui não funciona, isso aqui não é santo coisa nenhuma, não é Deus coisa nenhuma. R$ 500 reais, meu amigo, cinco salários mínimos, é o que custa nos mercados essa imagem - e tem gente que compra!" [...] Será que Deus, o criador do universo, pode ser comparado a um boneco desses, tão feio, tão horrível, tão desgraçado?" A comoção foi nacional, e a própria Universal o condenou.
Anna Virgínia Balloussier
Folhapress
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