Heloisa Cristaldo - Repórter da Agência Brasil
A
pesquisa foi feita pelo Instituto YouGov no Brasil, na Índia, na
Tailândia e no Reino Unido e ouviu 2.500 mulheres com idade acima de 16
anos nas principais cidades destes quatro países. No Brasil, foram
pesquisadas 503 mulheres de todas as regiões do país, em uma amostragem
que acompanhou o perfil da população brasileira feminina apontado pelo
censo populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE).
Todas as estudantes afirmaram que já foram assediadas em
suas cidades. Para a pesquisa, foram considerados assédio atos
indesejados, ameaçadores e agressivos contra as mulheres, podendo
configurar abuso verbal, físico, sexual ou emocional.
Formas de assédio
Em
relação às formas de assédio sofridas em público pelas brasileiras, o
assobio é o mais comum (77%), seguido por olhares insistentes (74%),
comentários de cunho sexual (57%) e xingamentos (39%). Metade das
mulheres entrevistadas no Brasil disse que já foi seguida nas ruas, 44%
tiveram seus corpos tocados, 37% disseram que homens se exibiram para
elas e 8% foram estupradas em espaços públicos.
“É quase uma
exceção raríssima que uma mulher não tenha sofrido assédio em um espaço
público. É muito preocupante. A experiência de medo, de ser assediada,
de sofrer xingamento, olhares, serem seguidas, até estupro e
assassinato. Os dados são impressionantes se pensarmos que a metade das
mulheres diz que foi seguida nas ruas, metade diz que teve o corpo
tocado”, diz a representante da ONU Mulheres, Nadine Gasman.
Desigualdade de gêneros
Para
a representante da ONU Mulheres no Brasil, os dados refletem a
desigualdade entre homens e mulheres na sociedade. “É uma questão de
gênero, de entender que na sociedade, qualquer que seja, as mulheres não
são consideradas iguais aos homens. A ideia é que a mulher está
subordinada no lar, na casa, no trabalho. Dados [da Organização Mundial
da Saúde] apontam que uma a cada três mulheres sofre violência
doméstica. Para os homens, os corpos e as vidas das mulheres são uma
propriedade, está para ser olhada, tocada, estuprada”, disse.
Segundo
Nadine, é necessário implementar políticas públicas que garantam a
segurança da mulher em espaços públicos, com políticas públicas
específicas, como a iluminação adequada das ruas e transporte público
exclusivo para mulheres.
“Quando se pensa que quase todas as
mulheres têm a experiência com abusos, não se tem a ideia do assédio.
Isso tem um impacto, isso limita de andar na rua com segurança e
direitos como educação e trabalho”, diz.
Falta repressão
A
professora de direito civil da Universidade de Brasília (UnB), Suzana
Borges, avalia que não há repressão adequada ao assédio à mulher em
espaços públicos.
“É uma questão social porque, em função de uma
posição histórica inferiorizada, a mulher foi objeto de repressão,
violência, não só nos espaços públicos, mas privados, dentro da família,
em casa, no trabalho”, disse.
Suzana Borges diz que há
necessidade das mulheres denunciarem as situações de assédio que
vivenciam no cotidiano. “Por se tratar de uma questão de gênero, a
denúncia é um mecanismo que reforça a proteção”.
Assédio por regiões
A
Região Centro-Oeste é onde as mulheres mais sofreram assédio nas ruas,
com 92% de incidência do problema. Em seguida, vêm Norte (88%), Nordeste
e Sudeste (86%) e Sul (85%).
No levantamento, as mulheres também
foram questionadas sobre em quais situações elas sentiram mais medo de
serem assediadas. 70% responderam que ao andar pelas ruas; 69%, ao sair
ou chegar em casa depois que escurece e 68% no transporte público.
Na
comparação com outros países, 43% das mulheres ouvidas na Inglaterra e
62% na Tailândia disseram que se sentiam mais inseguras nas ruas de suas
cidades, enquanto que, na Índia, o espaço de maior insegurança era o
transporte público, apontado por 65% das entrevistadas.
Campanha
Os
dados são publicados no lançamento do Dia Internacional de Cidades
Seguras para as Mulheres, uma iniciativa da organização para chamar a
atenção para os problemas de assédio e violência enfrentados pelas
mulheres nas cidades de todo o mundo.
“É bastante preocupante que
não haja uma perspectiva de gênero nas cidades, um planejamento que não
leve isso em conta, como horários, transportes e abordagem de ensino
nas escolas. Isso gera e perpetua uma cultura de violência, normatizada e
normalizada, de fazer parte do desenvolvimento masculino assediar
mulheres e isso não é questionado. A pesquisa mostra a naturalização da
violência como uma prática bastante arraigada. Há a necessidade urgente e
setorial de se enfrentar isso”, disse a coordenadora da campanha
Cidades Seguras para as Mulheres no Brasil, Glauce Arzua.
A
campanha Cidades Seguras para as Mulheres foi lançada pela ActionAid no
Brasil em 2014. O objetivo é promover uma melhoria da qualidade dos
serviços públicos nas cidades para tornar os espaços urbanos mais
receptivos a mulheres e meninas.
Glauce aponta a educação como
aspecto fundamental para que seja possível reverter o quadro de assédio
ao redor do mundo. “A abordagem educacional é uma chave para o
enfrentamento. Medidas como acontecem no Brasil, de vagões de trem
separados, são paliativas, transitórias. Temos que quebrar essa cultura,
que passa por campanhas, treinamento dos gestores, sobretudo criar
espaços para que o planejamento das cidades tenha essa perspectiva de
gênero”, diz.
Edição: Fábio Massalli
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