Quando o filho, Igor Baptista, 10, passou a se queixar de dores no
pescoço e na coluna, a administradora Daniela Dulcette começou uma
peregrinação para descobrir o que estava acometendo o menino. "Levei ele
no pediatra, que pediu vários exames, mas os resultados vieram normais.
Fiz de tudo, troquei travesseiro, passei arnica, mas ele continuava se
queixando. Fiquei com medo que estivesse com meningite. Passou mil
coisas pela minha cabeça."
Daniela tinha uma consulta marcada com um neurocirurgião para tratar de
uma dor no ciático e aproveitou para levar o filho. Durante o
atendimento, o especialista começou a questionar o que Igor fazia nas
horas vagas e identificou que ele estava com um problema muscular pela
postura em que ficava quando usava o tablet para brincar. "Como o iPad
estava com a bateria viciada, ele só funcionava plugado na tomada, por
isso o Igor sentava todo torto em uma cadeira moderna, de design, aquele
tipo de móvel pouco anatômico e desconfortável, tudo para manter o
aparelho conectado na tomada."
Segundo o neurocirurgião Vinicius Benites, da Unifesp (Universidade
Federal de São Paulo), as crianças estão sentindo mais dores nas costas.
Estudos brasileiros constataram que a prevalência de dor nas costas
varia de 32% a 57% entre crianças de sete a 14 anos. "Um dos motivos é a
diminuição da prática de atividade física. Antigamente, era comum
brincar na rua e correr, mas, hoje, todas as atividades estão
concentradas em torno de algum brinquedo tecnológico. Sem a prática de
exercício, as crianças ficam sedentárias e a musculatura abdominal fica
fraca, deixando a coluna desprotegida", explica Benites.
"Até a década passada, o maior vilão para a coluna vertebral das
crianças e adolescentes era o peso das mochilas. Atualmente, observamos
claramente que o padrão de dor nas costas nessa faixa etária mudou, e os
grandes vilões passaram a ser tablets e smartphones. Eles chegam a
representar 75% das causas de dores nas costas nas crianças e
adolescentes", fala João Paulo Bergamaschi, médico especialista em
coluna vertebral do Hospital Samaritano, ambos em São Paulo.
Ainda que as estruturas da coluna infantil sejam mais hidratadas e os
riscos de lesões sejam menores, se a má postura não for corrigida, a
criança poderá sofrer com os danos a essa parte do corpo. "A repetição
crônica dessas más posturas pode levar ao aumento do risco de
desenvolver alterações nas curvaturas da coluna, como escoliose
(curvatura lateral) e cifose (desvio). Também há o risco de desgaste
prematuro com ocorrência de degeneração discal e hérnias", explica
Alexandre Fogaça Cristante, ortopedista do Instituto de Ortopedia e
Traumatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP
(Universidade de São Paulo).
"A coluna possui várias curvaturas. Uma compensa a outra, uma está mais
estendida, outra mais suave para trás, mas, ao ficar muitas horas com
má postura, as vértebras são prejudicadas, o que pode evoluir para uma
artrose [quando o tecido flexível nas extremidades dos ossos se
desgasta] no futuro", afirma Pedro Pires, presidente da SBCM (Sociedade
Brasileira de Cirurgia da Mão).
Atualmente, o tratamento para as crianças e adolescentes com dores
musculares é medicamentoso. Segundo Benites, os remédios mais usados são
relaxantes musculares e anti-inflamatórios. "Também recomendamos
fisioterapia e RPG para recuperar a musculatura e a postura, além de
incentivar que a criança passe a praticar atividade física para
desenvolver os músculos", afirma Cristante.
Igor não precisou de nenhuma medicação para aliviar a dor, mas trocou o
lugar que usava o tablet, além de reduzir o tempo que fica no aparelho
ininterruptamente. "Já não deixava ele usar o iPad à vontade, mas o
médico recomendou que ele evitasse ficar 30 minutos na mesma posição,
sem se movimentar, portanto, essa é uma regra, mesmo que esteja no meio
da fase, ele pausa para se alongar", diz Daniela.
Além de trocar de posição a cada 30 minutos, manter a postura correta
enquanto usa os dispositivos também é importante para prevenir dores
musculares e eventuais problemas na coluna.
A pior posição para usar esses equipamentos, segundo os especialistas
ouvidos pelo UOL, é manter o tronco flexionado, a cabeça inclinada para
ver a tela, sem apoio dos braços. "Nossa cabeça não é leve e, ao
incliná-la, exercemos uma razoável pressão sobre a coluna vertebral. À
medida que a cabeça é inclinada para frente, a força gravitacional na
coluna aumenta, gerando um peso que pode chegar a 27 quilos", afirma
Bergamaschi.
Outra posição perigosa que os jovens adoram utilizar esses aparelhos é
enquanto estão deitados. "Muitas vezes, eles fazem uma flexão excessiva
da coluna cervical para facilitar a visualização da tela do aparelho, o
que acarreta em sobrecarga nessa região. Essa aproximação excessiva
também pode trazer danos oftalmológicos, portanto, quem quer usar o
tablet deitado, deve colocá-lo em um suporte específico à venda em lojas
especializadas", afirma Bergamaschi.
De acordo com os especialistas, a posição segura para usar o tablet e o
celular é com a coluna ereta e a lombar apoiada na cadeira, braços
sobre a mesa e o aparelho na altura dos olhos. "Também recomendamos
alternar a digitação entre polegar e outros dedos, além de reduzir a
velocidade da digitação para também não sobrecarregar as articulações,
músculos e tendões das mãos", explica Pires.
Fonte: Dourados Agora
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